
Em uma noite que une continentes, histórias e melodias, o “Conversa com Bial” desta sexta-feira, 25 de julho, se transforma num documentário íntimo e emocionante, conduzido por dois nomes que dispensam apresentações: Pedro Bial e Zeca Pagodinho. Mas desta vez, a roda de samba não é em Xerém, muito menos em um estúdio carioca. O cenário é um karaokê em Osaka, no Japão — uma cidade que pulsa entre luzes de néon e memórias silenciosas — onde o samba encontrou um novo lar, ao menos por uma noite.
No ar logo após o Jornal da Globo e às 23h45 no GNT, o programa especial joga luz sobre um encontro raro: o Brasil profundo e leve de Zeca e o olhar curioso e generoso de Bial, unidos em um canto improvável do mundo. Entre goles de cerveja, canções eternas e memórias costuradas pelo tempo, a edição vai muito além de uma entrevista — é um abraço cultural em quem assiste.
Um boteco de alma brasileira no coração de Osaka
Há algo de mágico quando culturas aparentemente distantes se encontram por afinidades invisíveis. Foi assim que o karaokê, símbolo pop da convivência japonesa, virou palco para um samba sincero. O microfone, geralmente usado por locais em interpretações de hits dos anos 80, agora estava nas mãos de Zeca Pagodinho, com seu chapéu panamá e aquela presença que enche qualquer espaço com afeto e verdade.
Ali, entre mesas apertadas, um telão exibindo letras e um público misto de brasileiros expatriados e japoneses curiosos, Zeca cantou “Conflito”, uma de suas pérolas afetivas. Ao lado de Pedro Bial, o clima era de roda de samba improvisada. Mas quem conhece Zeca sabe: o improviso é, muitas vezes, o ponto mais autêntico da arte.
“Não importa onde eu esteja. Se tiver cerveja gelada e alguém pra cantar comigo, tamo em casa”, brinca o cantor durante o papo, enquanto o público local batuca com as mãos na mesa, tentando acompanhar o ritmo que vem do coração.
De Irajá para o mundo: o Zeca que não precisa de palco
Nascido em Irajá, zona norte do Rio, Zeca viu a vida mudar quando a música deixou de ser passatempo e virou destino. Mas a fama nunca o distanciou das raízes. Ao contrário: ele sempre levou consigo o subúrbio, a rua, a conversa de bar, a sabedoria do povo. É isso que Pedro Bial, com sua escuta afiada, ajuda a revelar na conversa — não o Zeca artista, mas o Zeca homem, pai, amigo, brasileiro comum com dons extraordinários.
Durante a entrevista, Zeca revisita episódios marcantes da vida. Conta do dia em que Beth Carvalho o chamou para gravar pela primeira vez. Lembra dos tempos em que trabalhava como apontador de bicho e cantava em rodas de samba por prazer. E ri ao se lembrar do susto que a mãe levou quando ouviu sua voz no rádio pela primeira vez: “Achou que fosse outra pessoa. Falou: ‘Esse não é o Jessé!’”.
É essa autenticidade que fez com que Zeca se tornasse um dos sambistas mais amados do país — e agora, também, um embaixador informal da cultura brasileira na Ásia.
A Expo 2025 e o Brasil que canta além das fronteiras
O programa acontece no contexto da Expo 2025, que ocorre em Osaka e conta com participação do Brasil em uma série de eventos culturais. Além de Zeca, artistas como Mãeana, Lisa Ono e Bem Gil integram a programação. Mas, entre todos, é Zeca quem mais conecta com o público. Não por ter o maior palco ou a produção mais grandiosa — mas por carregar, na simplicidade de cada verso, uma parte da alma brasileira.
No evento, Zeca fez show para um público misto e entusiasmado. “Ver japonês cantando ‘Deixa a Vida Me Levar’ foi uma das coisas mais emocionantes que já vi”, revela Bial, ainda impactado. E realmente: a cena de centenas de vozes estrangeiras entoando em coro uma canção que nasceu nas ladeiras cariocas é uma prova de que a música atravessa fronteiras invisíveis.
O samba como memória afetiva de um país
Zeca é mais que um cantor. É cronista de um Brasil que resiste com leveza. Suas músicas falam de amor, de perdas, de esperanças e de saudades com uma linguagem que todo mundo entende. “Vai Vadiar”, “Maneiras”, “Verdade”, “Deixa a Vida Me Levar” — essas não são apenas faixas: são trilhas de vida. São hinos de momentos que cada brasileiro guarda como lembrança.
No programa, ele comenta que nunca planejou ser ídolo. “Eu só queria cantar, ué. Fazer um samba pra galera sorrir, pra aliviar o peso da vida”. E talvez por isso mesmo ele tenha se tornado tão essencial.
Um Brasil que não precisa de legenda
A presença de Zeca na televisão japonesa é discreta, mas significativa. Câmeras o seguem enquanto ele anda por Osaka, experimenta pratos locais, conversa com brasileiros que moram na cidade. “No Japão, o tempo é diferente. Tudo tem pausa. E samba também precisa de pausa, senão vira só batida”, filosofa.
Em uma cena belíssima, capturada pelas lentes da equipe do programa, ele ensina um grupo de japoneses a bater palma no ritmo do samba. Começa devagar, ajusta o compasso, até que o batuque coletivo se forma. Riem, erram, recomeçam. Não entendem o idioma, mas compreendem o espírito. E é isso que a música faz: comunica o que a linguagem formal não dá conta.
O jornalista que também se permite emocionar
Pedro, por sua vez, conduz o programa como quem guia uma visita ao próprio passado. Em diversos momentos, deixa transparecer a emoção — seja ao ouvir “O Sol Nascerá”, seja ao rever imagens da infância de Zeca. “Conversar com o Zeca é como ouvir o Brasil falar por meio de um samba. Ele transforma o cotidiano em poesia. É um dom raro”, diz o jornalista.
Ao longo da entrevista, Bial também reflete sobre o papel da cultura brasileira fora do país. “Ver um japonês cantar samba me dá a esperança de que nossa arte é maior do que pensamos. E de que ela pode, sim, salvar dias difíceis”.
De volta para casa, mas com o coração no Japão
A edição termina com Zeca caminhando pelas ruas iluminadas de Osaka. O olhar é curioso, mas sereno. “Aqui é diferente, mas também é parecido. Tem gente, tem silêncio, tem respeito. A gente acha que tá longe, mas a música aproxima”, diz ele, já com saudade no tom.
Ao fundo, ouve-se “Uma Prova de Amor”, em versão instrumental, enquanto a câmera se afasta. É o tipo de final que deixa um nó na garganta — não pela despedida, mas pela certeza de que encontros como esse deixam marcas que o tempo não apaga.
















