
Nesta terça-feira, dia 19 de agosto, a Sessão da Tarde leva ao ar um dos maiores sucessos da comédia nacional da última década: Até Que a Sorte Nos Separe. Lançado em 2012, o filme dirigido por Roberto Santucci conquistou o público ao misturar humor, crítica social e situações que muitos brasileiros, em maior ou menor escala, já enfrentaram: lidar com dinheiro, administrar (ou desperdiçar) conquistas e, principalmente, equilibrar a vida em família diante dos altos e baixos financeiros.
Muito além das risadas, a obra é um retrato divertido — e ao mesmo tempo reflexivo — sobre como a relação com o dinheiro pode transformar não apenas a vida de um casal, mas também suas prioridades e até mesmo sua maneira de se enxergar. Inspirado no best-seller “Casais Inteligentes Enriquecem Juntos”, de Gustavo Cerbasi, o filme traz Leandro Hassum e Danielle Winits em papéis que exploram tanto a leveza da comédia quanto dilemas que dialogam com a realidade.
O enredo: quando a fortuna se transforma em armadilha
A história começa com Tino (Leandro Hassum), um personal trainer simples, e sua esposa Jane (Danielle Winits), que levam uma vida comum até que a sorte lhes sorri de maneira inesperada: o casal ganha 100 milhões de reais na Mega-Sena. A notícia transforma radicalmente o cotidiano deles. Do dia para a noite, eles deixam para trás preocupações com contas e começam a viver de maneira luxuosa, mergulhando em um mundo de gastos sem limites, viagens, festas e extravagâncias.
Mas a felicidade fácil do dinheiro vem acompanhada de um efeito colateral: a falta de planejamento. Ao longo de 16 anos, Tino e Jane gastam sem pensar no amanhã. Nenhum investimento, nenhuma reserva, nenhum cuidado. Até que um dia, inevitavelmente, a fortuna acaba. E com ela, surge o desespero de quem não sabe lidar com a escassez após tanto tempo de abundância.
O choque financeiro cai sobre Tino, que se vê em apuros para contar à esposa sobre a falência iminente. A situação se agrava ainda mais quando Jane descobre que está grávida do terceiro filho, e o médico alerta que ela não pode receber nenhuma notícia ruim — sob risco de complicações na gestação. É nesse ponto que o enredo se transforma em uma comédia de desencontros, segredos e planos mirabolantes para esconder a verdade, tudo embalado por situações absurdas e hilárias.
O casal encontra no vizinho Amauri (Kiko Mascarenhas), um consultor financeiro metódico e burocrático, uma espécie de guia para tentar reorganizar a vida. O problema é que Tino, sempre atrapalhado, encontra maneiras nada ortodoxas de resolver os problemas, envolvendo amigos, filhos e até o bilionário tio de Jane em suas tentativas de não perder de vez a confiança da esposa.
Humanizando personagens que poderiam ser apenas estereótipos
Um dos grandes méritos do filme é a forma como os personagens são trabalhados. Jane, interpretada por Danielle Winits, poderia facilmente ter sido retratada como a típica “nova rica fútil”. No entanto, a atriz buscou dar profundidade à personagem, mostrando sua dimensão como mãe, esposa e mulher que luta para manter a família unida. Ela é vaidosa, sim, mas também resiliente, protetora e cheia de nuances.
Leandro Hassum, por sua vez, entrega um desempenho característico: expansivo, cheio de caras e bocas, mas também capaz de transmitir a fragilidade de um homem que, no fundo, só queria dar o melhor para a família e acabou se perdendo em suas escolhas. Seu carisma faz com que o público torça por ele mesmo diante de decisões equivocadas.
Amauri, vivido por Kiko Mascarenhas, entra como contraponto: metódico, racional, preso a regras. Ele representa a antítese de Tino, trazendo o olhar de quem sempre tenta manter a vida nos trilhos. Ainda assim, o personagem também passa por conflitos pessoais, especialmente no casamento com Laura (Rita Elmôr), mostrando que mesmo quem tenta controlar tudo não escapa das reviravoltas da vida.
Um olhar sobre o consumismo e a falta de planejamento
Embora seja uma comédia leve, o filme se apoia em uma crítica social muito relevante: a relação dos brasileiros com o dinheiro. O filme escancara o impacto da falta de educação financeira, tema que até hoje ainda é um desafio no país.
Ao acompanhar Tino e Jane, o público se depara com situações que parecem exageradas, mas que, em essência, são reais. Muitas pessoas que recebem grandes somas — seja por herança, prêmios ou mesmo crescimento profissional rápido — não sabem administrar o novo patamar financeiro. O resultado, muitas vezes, é o mesmo: dívidas, frustrações e, principalmente, conflitos familiares.
Essa reflexão ganha ainda mais força por ter sido inspirada no livro de Gustavo Cerbasi, que aborda justamente como casais podem (ou deveriam) alinhar suas finanças para evitar problemas. A obra literária foi a base para transformar o riso em um convite à reflexão, mostrando que, por trás das piadas, existe uma realidade que muitos preferem não encarar.
Produção e bastidores: improviso como marca registrada
O filme começou a ser rodado no início de 2012, com filmagens concentradas em cenários do Rio de Janeiro. O diretor Roberto Santucci, que já havia trabalhado em sucessos como De Pernas pro Ar, buscou repetir a fórmula de misturar humor popular com situações cotidianas, mas acrescentou um diferencial: dar espaço para a improvisação de Leandro Hassum.
Para isso, ele gravava muitas cenas com três câmeras simultâneas, permitindo que o ator tivesse liberdade de criar falas e expressões espontâneas. Segundo o próprio diretor, os primeiros takes eram sempre os melhores, já que carregavam a naturalidade das ideias surgidas no momento. Esse processo deu frescor ao longa e ajudou a aproximar o público do estilo televisivo de Hassum, conhecido de programas humorísticos.
Danielle Winits, em sua primeira grande protagonista no cinema, também destacou em entrevistas a importância de humanizar Jane e não deixá-la apenas no estereótipo da loira fútil. Sua entrega fez com que a personagem fosse lembrada como mais do que um acessório do marido atrapalhado: Jane é, de fato, uma mulher forte, guerreira e complexa.
Recepção da crítica: entre elogios ao humor popular e duras críticas técnicas
Se o público riu e lotou os cinemas, a crítica especializada não foi tão generosa. Muitos veículos destacaram problemas de roteiro, repetição de fórmulas e até comparações com esquetes televisivas.
O crítico Bruno Carmelo, do portal AdoroCinema, avaliou o filme com apenas 1 estrela em 5, classificando-o como “sintomático do modelo Globo Filmes de produção”, marcado por um humor considerado simplista e próximo de programas de auditório. Ele chegou a compará-lo a esquetes do Zorra Total, apontando falhas técnicas e atuações caricatas.
Renato Marafon, do CinePOP, também foi duro: para ele, a obra era uma “diversão instantânea”, que provoca algumas risadas mas não deixa memórias. “Nem o talento de Leandro Hassum consegue salvar a produção”, disse.
Já Alysson Oliveira, colunista da Reuters, ressaltou que o filme carecia de piadas realmente criativas, apoiando-se mais nos exageros faciais e vocais de Hassum do que em uma narrativa consistente.
Apesar disso, muitos críticos reconheceram que o filme cumpriu seu papel de entreter o grande público, e que o apelo popular era justamente sua força.
Sucesso de bilheteria: números que impressionaram
Se a crítica foi dividida, a bilheteria não deixou dúvidas: O longa foi um sucesso retumbante. Em seu primeiro fim de semana, levou 320 mil espectadores aos cinemas, tornando-se a melhor abertura de um filme nacional em 2012.
Poucos dias depois, já havia ultrapassado a marca de 1 milhão de ingressos vendidos, chegando a mais de 1,6 milhão de espectadores em apenas duas semanas. No total, arrecadou cerca de 17 milhões de dólares, superando de longe o orçamento inicial de 6 milhões de reais.
O sucesso garantiu não apenas popularidade, mas também a certeza de que a história ainda teria fôlego para continuar.
Sequências e legado
O impacto do primeiro filme foi tão grande que, ainda em 2012, a Paris Filmes anunciou duas continuações. Até Que a Sorte Nos Separe 2 (2013): trouxe Camila Morgado no papel de Jane, substituindo Danielle Winits, que estava envolvida em uma novela da Globo. A trama seguiu explorando as confusões financeiras e familiares de Tino. Até Que a Sorte Nos Separe 3: A Falência Final (2015): fechou a trilogia, consolidando o personagem de Leandro Hassum como um dos mais icônicos da comédia nacional da época.
Juntas, as três produções consolidaram uma das franquias mais populares do cinema brasileiro recente, mostrando que havia público fiel para esse tipo de humor. A produção vai ao ar na TV Globo às 15h25, no horário de Brasília.
















