Mestres da Carpintaria | Exposição na Japan House São Paulo revela a alma da carpintaria japonesa

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Foto: Reprodução/ Internet

O Japão é um país onde a natureza e a tradição caminham lado a lado. Com cerca de 67% de seu território coberto por florestas, segundo dados da Embaixada do Japão no Brasil, o respeito pelas árvores e pelo equilíbrio ambiental faz parte do modo de vida japonês há séculos. É desse elo sagrado entre o homem e a natureza que surge uma das expressões mais refinadas da cultura nipônica: a carpintaria tradicional, arte que transforma madeira em arquitetura sem o uso de pregos ou metais, apenas com precisão, sensibilidade e sabedoria ancestral.

É esse universo de técnica e espiritualidade que inspira a exposição “Imbuídos das forças das florestas do Japão – Mestres da carpintaria: habilidade e espírito”, aberta ao público a partir de 11 de novembro, no térreo da Japan House São Paulo (JHSP). A mostra mergulha na filosofia, na estética e no respeito que os carpinteiros japoneses cultivam pela madeira, apresentando como a harmonia com a natureza pode ser o alicerce para construções duradouras e cheias de significado.

O diálogo entre o homem e a floresta

Com curadoria de Marcelo Nishiyama, diretor associado e curador-chefe do Takenaka Carpentry Tools Museum, em Kobe, a exposição convida o público a compreender o olhar quase espiritual que o Japão dedica às florestas. Antes de iniciar qualquer obra, o carpinteiro pede permissão às divindades das montanhas e observa atentamente cada árvore. A escolha da madeira ideal depende do lugar onde ela cresceu, da velocidade do seu desenvolvimento e até da direção dos ventos que moldaram sua forma.

“Assim como as pessoas, as árvores têm personalidades próprias”, explica o curador. “As que crescem nas montanhas são mais firmes e indicadas para pilares e vigas; já as que nascem nos vales, onde o crescimento é mais rápido, servem melhor aos acabamentos e detalhes decorativos.” Essa observação minuciosa revela a delicada relação entre técnica e espiritualidade que sustenta a carpintaria japonesa — uma arte em que cada corte é guiado por respeito e propósito.

Técnica milenar e filosofia estética

Depois de passar pelas Japan Houses de Londres e Los Angeles, a mostra chega a São Paulo com um diferencial: uma segunda etapa prevista para março de 2026, dedicada à técnica kigumi, que consiste em encaixar peças de madeira perfeitamente entalhadas, dispensando o uso de pregos ou parafusos. Essa tradição milenar, símbolo de engenhosidade e durabilidade, também está presente na própria fachada da Japan House São Paulo, construída com mais de seis toneladas de madeira hinoki (cipreste japonês), material nobre e resistente usado há séculos pelos mestres carpinteiros.

A exposição também apresenta os dois principais estilos desse ofício: os dōmiya daiku, responsáveis por templos e santuários, e os sukiya daiku, especializados em casas de chá — espaços de introspecção e harmonia que expressam o ideal de simplicidade japonesa.

A delicadeza da Casa de Chá

Um dos pontos altos da mostra é a réplica em escala real da Casa de Chá Sa-an, pertencente ao templo Daitoku-ji Gyokurin-in, em Quioto. Erguida originalmente em 1742, a casa reflete o refinamento da carpintaria sukiya, caracterizada pelo uso de bambu e madeiras naturais. No modelo apresentado na JHSP, partes do teto e das paredes foram propositalmente abertas para revelar os encaixes invisíveis que sustentam a estrutura — uma oportunidade rara de observar a beleza interna que normalmente fica oculta.

Cada junta, cada entalhe, cada linha da construção expressa o cuidado e a paciência de quem compreende que a arquitetura é também uma forma de meditação.

Ferramentas que contam histórias

A exposição também exibe 87 ferramentas tradicionais utilizadas pelos mestres da madeira. São instrumentos que carregam séculos de conhecimento e uma filosofia que valoriza o toque humano. Para ampliar a experiência, o público poderá acessar QR Codes que disponibilizam vídeos, imagens e descrições detalhadas sobre o uso de cada ferramenta.

“Queremos que o visitante mergulhe completamente nesse universo”, explica Natasha Barzaghi Geenen, diretora cultural da JHSP. “A carpintaria japonesa desperta admiração não apenas pela precisão técnica, mas pelo modo como ela expressa valores humanos como respeito, paciência e harmonia.”

Uma floresta no coração de São Paulo

A experiência sensorial é outro dos grandes encantos da mostra. Uma instalação imersiva recria a atmosfera das florestas japonesas, permitindo que os visitantes sintam o perfume de oito tipos de madeira — entre elas hinoki (cipreste japonês), sugi (cedro) e sakura (cerejeira). Sons e aromas se misturam para transportar o público ao interior do Japão, despertando o mesmo sentimento de reverência que inspira os mestres carpinteiros.

Durante a semana de abertura, a JHSP promoverá visitas guiadas, palestras com o curador Marcelo Nishiyama e outras atividades educativas voltadas ao diálogo entre tradição, sustentabilidade e arte.

Acessibilidade e inclusão

Fiel à sua missão de tornar a cultura japonesa acessível a todos, a Japan House São Paulo integra a mostra ao programa JHSP Acessível, que oferece recursos táteis, audiodescrição e vídeos em Libras. Assim, a experiência poderá ser vivida de forma plena por pessoas com diferentes tipos de deficiência, reforçando a importância da inclusão também no campo da arte e do patrimônio cultural.

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