
Zootopia 2 chega aos cinemas carregando o peso de suceder uma das animações mais marcantes da última década. O filme original, lançado em 2016, conquistou o público ao combinar humor, aventura e uma crítica social ampla, situando seus personagens em uma metrópole vibrante onde conviviam diversidade e tensão. Agora, a continuação retoma esse universo de forma mais complexa, emocionalmente mais elaborada e disposta a expandir discussões que permanecem urgentes. A nova trama acompanha Judy Hopps e Robert Wilde em um ponto delicado de suas jornadas, revelando como feridas antigas influenciam não apenas o vínculo entre eles, mas a maneira como cada um encara suas convicções mais profundas.

A história ganha novo fôlego com a introdução da influente Família Lynxley, guardiã do Diário de Fundação, peça histórica que preserva a versão oficial das origens da cidade. Quando o artefato é roubado por Gary, uma cobra pertencente a uma espécie historicamente marginalizada após um episódio distorcido e mal interpretado, o filme deixa de lado qualquer expectativa de aventura convencional. O roubo funciona como catalisador para uma investigação maior: uma reflexão sobre memória, apagamento e a forma como versões oficiais moldam identidades coletivas. Nada é apresentado como mera coincidência; cada gesto aponta para feridas abertas e disputas por narrativas que definem quem pertence e quem permanece à margem.
Nibbles, especialista em répteis e relações interespécies, surge para equilibrar o enredo com frescor e profundidade. Sua presença cria conexões onde antes existiam muros, instigando Judy, Robert e o próprio público a enxergar além das tensões superficiais. Mais do que uma coadjuvante, ela funciona como mediadora em um debate sobre convivência e responsabilidade histórica. O grupo formado por Judy, Robert, Gary e Nibbles ressignifica o filme como uma travessia de escuta e reconciliação, destacando que conflitos sociais raramente são fruto de indivíduos isolados, mas sim de estruturas que perpetuam silêncios e desigualdades.
Apesar de lidar com temas densos, Zootopia 2 mantém o humor afiado que caracteriza a franquia. As cenas cômicas surgem no momento certo, oferecendo respiro emocional sem comprometer o impacto do drama. E é justamente no drama que o filme encontra seu núcleo mais pulsante, discutindo ancestralidade, identidades reprimidas, políticas de coexistência e a necessidade de revisar o passado com honestidade. A narrativa não idealiza a história da cidade; pelo contrário, questiona ativamente quem construiu essas memórias e por que algumas vozes foram excluídas.
Ao invés de tentar superar o primeiro filme em grandiosidade, a continuação opta por amadurecer. Reconhece que seu público cresceu e ajusta o tom para acompanhar essa evolução. A obra abraça silêncios, incertezas e recomeços, entendendo que histórias verdadeiras se fortalecem quando enfrentam suas próprias sombras. É um filme que se permite desacelerar para aprofundar, ao invés de acelerar para impressionar.
No desfecho, a continuação se revela não apenas competente, mas necessária. Judy e Robert emergem mais complexos e vulneráveis, enquanto Gary e Nibbles ampliam o escopo emocional e político da trama com novas perspectivas. Zootopia, sempre vibrante, mostra que ainda possui muito a aprender sobre si mesma. A obra reafirma que memórias não devem ser apagadas, mas revisitadas e reconstruídas com responsabilidade. O resultado é um filme que não se limita a continuar uma história, mas a expandi-la com propósito e sensibilidade.





