
Na última sexta-feira, 19 de setembro, o programa Quilos Mortais, exibido pela Record, apresentou uma das histórias mais impactantes de sua temporada: a trajetória de Ashley Bernard, uma jovem de 31 anos que chegou ao peso extremo de 289 quilos. A obesidade severa a deixou acamada, sem mobilidade e dependente da família até para as tarefas mais básicas do dia a dia.
Por trás desses números assustadores, no entanto, existe uma narrativa humana marcada por traumas, abandono, maternidade solitária, dor e, sobretudo, coragem. A luta de Ashley não é apenas contra a balança, mas contra as circunstâncias que a levaram a perder o controle da própria vida. Sua presença no programa trouxe à tona não apenas os desafios físicos da obesidade, mas também os dilemas emocionais e sociais que permeiam a vida de milhares de pessoas em condições semelhantes.
Infância marcada por traumas e a busca por refúgio na comida
Ashley relatou durante o episódio que sua relação com a comida nunca foi simples. Desde criança, ela enfrentou episódios de abandono e traumas familiares que minaram sua autoestima. Sem o apoio emocional necessário para lidar com tanta dor, encontrou nos alimentos um alívio imediato. Comer se transformou em uma válvula de escape para as angústias que não conseguia expressar de outra maneira.
Esse ciclo vicioso se repetiu ao longo dos anos. Cada decepção, cada ausência e cada rejeição eram compensadas por refeições cada vez maiores, até que a comida deixou de ser apenas nutrição e se tornou um anestésico para feridas emocionais abertas. Ao chegar à vida adulta, Ashley já carregava em si não apenas quilos a mais, mas também o peso invisível da solidão e das lembranças dolorosas.
A situação se agravou ainda mais durante suas gestações. Ao ser abandonada pelos parceiros em momentos tão delicados, Ashley mergulhou em sentimentos de abandono e desamparo. Mais uma vez, buscou refúgio no que lhe era familiar: a comida. Essa busca por conforto imediato acelerou o ganho de peso, levando-a, em pouco tempo, a uma condição crítica.
Quando a vida se torna insustentável
O corpo de Ashley passou a dar sinais claros de que já não suportava tantos excessos. Com quase 300 quilos, ela perdeu a capacidade de andar sozinha, precisou deixar sua própria casa e se viu obrigada a voltar a morar com os pais. Essa decisão, embora necessária, trouxe à tona um dos capítulos mais dolorosos de sua vida: a impossibilidade de cuidar dos próprios filhos.
Sua filha mais velha, Anaya, que na época tinha apenas 11 anos, foi quem assumiu a responsabilidade de cuidar da irmã bebê. Ainda criança, Anaya precisou amadurecer às pressas para suprir as ausências da mãe, aprendendo a dar banho, preparar mamadeiras e acalmar choros. O peso da maternidade precoce recaiu sobre ela, enquanto Ashley, imóvel e devastada emocionalmente, assistia a tudo sem forças para intervir.
Essa realidade deixou marcas profundas em todos os envolvidos. Para Ashley, era insuportável sentir-se prisioneira do próprio corpo e, ao mesmo tempo, perceber que suas limitações estavam roubando a infância da filha. Para a família, a luta não era apenas contra a obesidade, mas contra o tempo, na tentativa de evitar que a situação chegasse a um ponto irreversível.
A decisão de mudar: o encontro com Dr. Nowzaradan
Foi nesse cenário de dor e impotência que Ashley decidiu buscar ajuda. Sua esperança tinha nome e endereço: o renomado Dr. Nowzaradan, cirurgião bariátrico especialista em casos extremos de obesidade e figura central do programa “Quilos Mortais”.
Dr. Now é conhecido por sua postura firme, muitas vezes dura, mas sempre direcionada ao sucesso de seus pacientes. Seu método é claro: antes da cirurgia, é preciso comprovar disciplina e força de vontade, seguindo uma dieta rigorosa e praticando exercícios compatíveis com a condição física de cada paciente.
Ashley sabia que não seria fácil. A mudança exigiria não apenas esforço físico, mas uma verdadeira transformação de mentalidade. Ainda assim, agarrou-se à ideia de que cada quilo eliminado poderia significar um passo a mais em direção à liberdade — e, sobretudo, à chance de recuperar seu papel de mãe ativa.
Um processo doloroso, mas transformador
Os primeiros meses de tratamento foram marcados por sacrifícios. A rotina alimentar de Ashley foi totalmente reformulada. Porções gigantes de fast food, refrigerantes e doces deram lugar a alimentos leves, ricos em proteínas e com baixa ingestão calórica. O impacto inicial foi duro, mas aos poucos seu corpo respondeu positivamente.
Com o apoio da equipe médica, ela também iniciou pequenas atividades físicas, adaptadas à sua mobilidade. Levantar-se da cama sem ajuda, caminhar dentro de casa, realizar alongamentos simples — gestos que pareciam impossíveis voltaram a fazer parte de sua rotina.
O esforço rendeu frutos: em menos de 12 meses, Ashley eliminou mais de 61 quilos. Essa vitória não era apenas visível no corpo, mas também em sua expressão. Sua autoestima começou a dar sinais de renascimento, e o olhar antes apagado recuperava lentamente o brilho da esperança. Foi então aprovada para realizar a cirurgia bariátrica, marco crucial de sua jornada.
O procedimento não foi apenas uma intervenção médica, mas um verdadeiro divisor de águas. A bariátrica abriu portas para uma vida com mais mobilidade, menos dores e novas perspectivas.
Desafios após a cirurgia
Apesar dos avanços, a trajetória de Ashley não foi livre de obstáculos. A cirurgia é apenas o início de uma nova etapa, que exige disciplina constante. Muitos pacientes, ao longo do tempo, enfrentam recaídas, dificuldades em manter hábitos saudáveis ou até crises emocionais que ameaçam colocar tudo a perder.
Ashley mostrou que ainda precisava lidar com esses fantasmas. O peso não desaparece apenas do corpo, mas também da mente, onde as feridas emocionais continuam exigindo cuidado. Ainda assim, cada conquista era celebrada: poder levantar da cama sem ajuda, brincar com os filhos ou simplesmente dar uma volta no quintal eram vitórias que representavam uma nova vida em construção.

A vida atual: redes sociais como espaço de inspiração
Hoje, Ashley é mãe solo de quatro filhos e encontrou nas redes sociais um espaço para compartilhar sua história e inspirar outras pessoas. Em plataformas como Facebook, TikTok e Instagram, soma mais de 70 mil seguidores.

Se antes ela era vista como uma mulher aprisionada em seu corpo, agora se mostra em vídeos dançando, sorrindo, brincando com os filhos e aproveitando momentos simples. As postagens não buscam ostentar um emagrecimento radical, mas transmitir alegria, autenticidade e resiliência.
Embora as fotos mais recentes não revelem uma transformação estética tão dramática quanto a esperada, o que salta aos olhos é a leveza com que ela encara a vida. Ashley não vive para atender a padrões externos; vive para ser feliz ao lado dos filhos e para mostrar que sempre é possível recomeçar.





