Resenha — Esperança mostra que mudar o mundo também começa ao aceitar as próprias fragilidades

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Esperança se apresenta como uma narrativa delicada e profundamente humana sobre recomeços, pertencimento e vulnerabilidade emocional. A obra acompanha a trajetória de uma jovem determinada que, ao se mudar para uma nova cidade, se vê diante do desafio de reconstruir sua identidade, suas relações e sua forma de enxergar o mundo. Mais do que uma história sobre adaptação, o livro se propõe a refletir sobre os limites do idealismo e a necessidade, muitas vezes ignorada, de aceitar ajuda.

A protagonista que dá nome à obra é construída como uma personagem engajada, ativa e movida por um forte senso de justiça social. Seu desejo de combater preconceitos e contribuir para um mundo melhor não surge como discurso vazio, mas como parte orgânica de sua personalidade. No entanto, o livro acerta ao não romantizar esse engajamento. Ao longo da narrativa, fica evidente que carregar o peso de querer salvar tudo e todos pode ser exaustivo, especialmente quando se negligenciam as próprias fragilidades.

O processo de adaptação à nova cidade funciona como um espelho emocional para Esperança. Cada novo ambiente, relação ou conflito expõe suas inseguranças e revela o quanto o sentimento de pertencimento precisa ser construído com tempo, escuta e troca. O texto aborda com sensibilidade os choques entre expectativas e realidade, mostrando que recomeçar nem sempre é sinônimo de entusiasmo, mas muitas vezes de solidão silenciosa.

As relações afetivas ocupam papel central na narrativa. O namoro, as amizades e os vínculos familiares são apresentados como espaços de apoio, mas também de conflito e aprendizado. O livro se destaca ao tratar essas relações de forma honesta, sem idealizações excessivas. Amar, aqui, não significa ausência de problemas, mas disposição para enfrentar dificuldades juntos, inclusive quando isso exige reconhecer limites e pedir socorro.

Um dos temas mais relevantes de Esperança é justamente a dificuldade da protagonista em aceitar ajuda. Acostumada a ser forte, ativa e solidária, ela precisa aprender que vulnerabilidade não é fraqueza. Essa mensagem atravessa a obra de maneira orgânica e toca em uma questão contemporânea urgente, especialmente entre jovens que se sentem pressionados a demonstrar resiliência constante e engajamento irrepreensível.

A escrita é simples, direta e emocionalmente acessível, o que amplia o alcance da história e facilita a identificação do leitor. Em alguns momentos, a narrativa adota um tom mais linear e previsível, o que pode limitar a complexidade dramática. Ainda assim, essa escolha reforça o caráter acolhedor do livro e sua vocação para dialogar com leitores que buscam histórias de conforto, reflexão e reconhecimento pessoal.

Resenha — A Sabedoria das Noviças prova que as inquietações modernas já atormentavam mulheres brilhantes há séculos

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À primeira vista, A sabedoria das noviças: Conselhos do século XVI para problemas do século XX pode parecer apenas um exercício curioso de aproximação entre passado e presente. No entanto, o livro de Ana Garriga e Carmen Urbita revela-se muito mais ambicioso: trata-se de uma obra que revisita a história das freiras dos séculos XVI e XVII para desmontar estereótipos, recuperar vozes femininas silenciadas e, sobretudo, demonstrar que as angústias humanas atravessam o tempo com impressionante persistência.

O ponto de partida do livro é provocador. Em vez de apresentar a vida monástica como sinônimo de isolamento, repressão ou santidade inalcançável, as autoras revelam conventos como espaços de pensamento, estratégia, produção intelectual e até negociação de poder. As noviças e freiras retratadas aqui não são figuras passivas, mas mulheres que encontraram, dentro de estruturas rígidas, maneiras engenhosas de existir, criar e influenciar o mundo ao seu redor.

Santa Teresa de Ávila, Sor Juana Inés de la Cruz e Maria de Jesus de Ágreda são algumas das personagens históricas convocadas para esse diálogo improvável com o leitor contemporâneo. Longe de serem tratadas como santas intocáveis, elas surgem como mulheres de carne, ideias e contradições. Seus escritos, escolhas e episódios biográficos são reinterpretados à luz de problemas atuais, como dificuldades financeiras, desafios no ambiente corporativo, comunicação assertiva, ansiedade social e confusões afetivas.

O grande mérito do livro está na forma como essa transposição é feita. Garriga e Urbita não forçam paralelos nem recorrem a comparações artificiais. Ao contrário, constroem analogias inteligentes e bem-humoradas, capazes de iluminar tanto o contexto histórico quanto as tensões do presente. O famoso episódio da bilocação atribuída a Maria de Jesus de Ágreda, por exemplo, é reinterpretado como uma metáfora poderosa para o sentimento contemporâneo de estar sempre atrasado, desconectado ou perdendo algo nas redes sociais.

Sor Juana Inés de la Cruz ocupa um lugar central na narrativa como símbolo de inteligência feminina, resistência intelectual e domínio da palavra. Sua habilidade retórica e sua postura firme diante de autoridades masculinas servem como inspiração direta para situações modernas, como escrever um e-mail profissional sem parecer agressiva ou submissa. O livro acerta ao mostrar que, muito antes das discussões atuais sobre comunicação assertiva, essas mulheres já dominavam a arte de se posicionar em ambientes hostis.

A escrita das autoras é leve, irônica e convidativa. O texto evita o tom acadêmico tradicional e aposta em uma linguagem acessível, repleta de referências à cultura pop, ao universo corporativo e às dinâmicas das relações afetivas contemporâneas. Essa escolha torna a leitura fluida e prazerosa, ainda que, em alguns momentos, sacrifique maior profundidade teórica. Ainda assim, trata-se de uma decisão coerente com a proposta do livro: aproximar, não afastar.

Outro aspecto relevante é a forma como A sabedoria das noviças contribui para a revisão da história sob uma perspectiva feminina. Ao recuperar essas trajetórias, o livro evidencia o quanto a vida monástica foi, paradoxalmente, um dos poucos espaços onde mulheres puderam estudar, escrever, ensinar e exercer algum grau de autonomia intelectual. Essa leitura não romantiza o convento, mas reconhece sua complexidade como espaço de limitação e, ao mesmo tempo, de possibilidade.

Embora o subtítulo mencione problemas do século XX, o diálogo estabelecido pela obra é ainda mais pertinente ao século XXI. Questões como ansiedade, pressão por produtividade, medo de exclusão social e insegurança emocional atravessam o livro de maneira clara e atual. Nesse sentido, a obra funciona menos como um manual de conselhos e mais como um convite à reflexão, usando o humor e a história como ferramentas de acolhimento.

A sabedoria das noviças é um livro que diverte, informa e provoca. Ao transformar figuras históricas em interlocutoras contemporâneas, Ana Garriga e Carmen Urbita constroem uma obra que questiona nossas certezas, relativiza nossos dramas e oferece um olhar surpreendentemente reconfortante sobre o presente. Uma leitura inteligente e criativa, que reafirma que, independentemente da época, as dúvidas humanas seguem as mesmas e que a sabedoria, muitas vezes, já foi escrita há séculos, apenas esperando ser redescoberta.

Crítica – No deserto da opressão, Quebrando Regras cultiva esperança e liberdade

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Poucos filmes contemporâneos traduzem com tanta precisão o entrelaçamento entre política, educação, gênero e tecnologia quanto Quebrando Regras. A obra dirigida por Bill Guttentag ultrapassa os limites de um drama inspirador para se tornar um documento ficcionalizado de resistência. É um longa que não apenas conta uma história real — a das Afghan Dreamers, equipe de meninas afegãs que ousou competir em um torneio internacional de robótica —, mas questiona o que estamos fazendo, como humanidade, com os sonhos dos mais vulneráveis.

Baseado em eventos reais, o filme se ancora em um paradoxo doloroso: enquanto uma equipe de adolescentes constrói robôs com criatividade, inteligência e paixão, sua própria sociedade insiste em desumanizá-las. Entre fios, sensores e circuitos, o espectador testemunha algo ainda mais urgente sendo costurado: a tentativa desesperada de se afirmar como sujeito em um mundo que nega até o direito de existir com dignidade.

Guttentag não escolhe o caminho fácil. Seu olhar é empático, mas jamais condescendente. A câmera observa mais do que dramatiza. Permite que a indignação nasça não da trilha sonora ou de grandes discursos, mas do cotidiano das protagonistas: um visto negado por “falta de documentação”, a censura do próprio pai, a patrulha do comportamento feminino por parte do Estado e da vizinhança. Cada barreira enfrentada revela mais sobre os mecanismos cruéis de opressão institucionalizada — e, ao mesmo tempo, sobre a força revolucionária da juventude.

O roteiro, coescrito por Jason Brown e Elaha Mahboob (irmã de Roya Mahboob, a fundadora da equipe original), acerta ao não romantizar a jornada. Não há triunfos fáceis, não há redenção completa. A vitória, aqui, não se mede por troféus, mas pela insistência em sonhar, mesmo quando o sonho pode custar tudo.

Visualmente, Quebrando Regras é discreto, quase austero. Mas é justamente essa contenção estética que permite que os sentimentos explodam com mais verdade. A emoção nasce nos detalhes: no olhar de uma mãe que hesita entre o medo e o orgulho; na tensão de uma entrevista de visto; na alegria clandestina de se conectar com o mundo, mesmo que por alguns dias, em solo estrangeiro.

O filme também levanta discussões mais amplas sobre como o Ocidente lida com histórias como essa. A mesma comunidade internacional que aplaude as conquistas das meninas muitas vezes é a que lhes vira as costas quando pedem asilo ou proteção. Quebrando Regras não permite o conforto de se emocionar e seguir em frente — ele cutuca, desafia, cobra.

Ao final, o que permanece é a noção de que a robótica, para essas meninas, não é apenas ciência. É linguagem. É resistência. É uma maneira de se projetar no futuro quando o presente tenta apagá-las. Em um mundo que frequentemente apaga vozes femininas, especialmente em regiões de conflito, o simples ato de construir um robô torna-se um gesto revolucionário.

Quebrando Regras é um filme necessário. Não porque traz uma mensagem bonita, mas porque nos obriga a encarar a realidade com olhos menos complacentes. E a entender que, às vezes, os maiores atos de coragem começam com um fio de cobre e uma faísca.

Crítica – Missão: Impossível – Acerto de Contas vai além da ação e entrega emoção, profundidade e alma

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Foto: Reprodução/ Internet

O mais recente capítulo da franquia Missão: Impossível não se limita a entregar o espetáculo de ação que o público espera. Ele vai além — e mergulha o espectador em uma experiência sensorial e emocional desde os primeiros minutos. É um filme quente — e não apenas pelas explosões coreografadas com maestria ou pelas locações escaldantes. O calor aqui é simbólico: representa memória, paixão, esperança e criação. Elementos que, quando mal direcionados, tornam-se forças perigosas — e é a partir desse conceito que o longa constrói sua tensão e sua profundidade dramática.

Desde a abertura, marcada por uma estética VHS, o filme evoca uma nostalgia que transcende o mero saudosismo visual. Trata-se de uma escolha narrativa que questiona a autenticidade em tempos digitais — um comentário sutil, mas contundente, sobre a era em que memórias podem ser editadas por algoritmos e sentimentos simulados por inteligência artificial. Em vez de respostas, o filme nos oferece perguntas — e isso, no contexto de um blockbuster, é um diferencial raro.

O roteiro acerta ao dar nova dimensão ao protagonista Ethan Hunt. Pela primeira vez, ele não surge apenas como executor de façanhas sobre-humanas, mas como um homem moldado por suas decisões, cicatrizes e relações. Ao seu redor, aliados ganham profundidade emocional, deixando de ser meros coadjuvantes. Cada um deles carrega histórias de perda, redenção e propósito, refletindo a força da empatia em tempos marcados por polarização. São personagens que poderiam ter sido movidos pelo ódio, mas escolhem o caminho da esperança — e se tornam, assim, os verdadeiros agentes de mudança da trama.

A mensagem central é clara e poderosa: mesmo diante do medo, do erro e da autocrítica constante, ainda é possível tentar de novo. E fazer melhor. O filme nos lembra que somos definidos pelas escolhas que fazemos e que, mesmo nas maiores adversidades, a transformação é possível.

Visualmente deslumbrante e narrativamente ousado, Missão: Impossível – Acerto de Contas reafirma o potencial do cinema de ação como arte com propósito. Tom Cruise não apenas atua — ele entrega uma experiência cinematográfica feita para a grande tela, com a precisão de um veterano que entende o poder da imagem, do ritmo e da emoção.

No fim das contas, este não é apenas mais um capítulo de uma franquia de sucesso. É um lembrete de que, quando conduzido com paixão, inteligência e humanidade, o cinema de ação pode emocionar, provocar e transformar. E essa, sem dúvida, é uma missão cumprida.

Crítica – Confinado é um duelo sufocante entre classes dentro de um carro e fora da bolha social

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“Confinado” é um thriller psicológico enxuto, mas profundamente simbólico, que transforma um espaço limitado — o interior de um carro trancado — em um palco tenso para um embate ideológico entre classes. Em vez de recorrer a grandes cenários ou reviravoltas mirabolantes, o filme aposta na intimidade, no silêncio e na densidade emocional para construir sua narrativa, tornando-se uma experiência claustrofóbica tanto física quanto socialmente.

A trama gira em torno de William, um homem rico e influente, representante da elite corporativa, e Eddie, um trabalhador em situação de vulnerabilidade, marginalizado pelo sistema. O encontro entre os dois é forçado, inesperado, e rapidamente se transforma em um jogo psicológico de poder, medo e sobrevivência. A tensão é constante, mas não se restringe à ameaça física: ela pulsa nas entrelinhas, nos olhares, nos julgamentos e nos silêncios que dizem mais do que as palavras.

O grande trunfo do filme está em sua capacidade de usar a linguagem visual como ferramenta de discurso. A direção aposta em enquadramentos fechados, muitas vezes centrando-se nos rostos dos personagens ou nos limites estreitos do carro, o que amplia a sensação de aprisionamento. A iluminação fria e o design de som minimalista ajudam a compor uma atmosfera sufocante, onde não há espaço para alívio — emocional ou moral.

O carro, aqui, não é apenas um cenário. Ele se converte em metáfora clara e potente: um microcosmo da estrutura social, com suas divisões rígidas e papéis predeterminados. William, mesmo preso, carrega os privilégios que sua classe lhe confere — o controle, a arrogância, a falsa sensação de imunidade. Eddie, por sua vez, encontra naquele momento uma chance de virar o jogo, mesmo que brevemente, expondo as feridas e fraturas de um sistema que o empurrou para os extremos.

As atuações são outro ponto alto. O intérprete de Eddie transmite com precisão a frustração acumulada, a raiva contida e a complexidade de alguém que não é herói nem vilão, apenas um ser humano tentando sobreviver em um mundo hostil. Já William é interpretado com uma frieza que beira o desprezo, mas sem caricatura: há nuances, há rachaduras que vão surgindo conforme a máscara de superioridade começa a desmoronar.

Diferente de filmes que abordam o conflito de classes de forma didática ou panfletária, “Confinado” opta por uma abordagem mais sutil. A crítica social está lá, mas emerge das ações e reações dos personagens, da construção simbólica do espaço, e principalmente da tensão que se instala entre os mundos que eles representam. Ao evitar soluções fáceis e moralismos, o longa propõe um olhar mais incômodo e realista sobre o abismo social que nos cerca.

Ao final, “Confinado” deixa o espectador com mais perguntas do que respostas — e essa é justamente sua força. Em tempos de polarização e desigualdade crescente, o filme nos obriga a encarar os limites de nossas próprias bolhas, e como, muitas vezes, somos cúmplices de um sistema que aprisiona a todos, ainda que em graus e formas diferentes.

Crítica – Bailarina é arte e brutalidade em perfeita harmonia no universo de John Wick

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Com Bailarina, o universo de John Wick ganha um novo e vibrante fôlego. Sob a direção segura de Len Wiseman, conhecido por seu domínio estético em filmes de ação estilizados, o spin-off ousa levar a franquia a uma direção mais sensorial e intimista, centrada em uma figura feminina poderosa e complexa. Eve Macarro, interpretada com força e sutileza por Ana de Armas, é uma assassina moldada pela tragédia e treinada pela enigmática organização Ruska Roma — introduzida em John Wick: Capítulo 3 — e agora explorada com mais profundidade.

Logo de início, o longa deixa claro que sua proposta é mergulhar o público em uma atmosfera densa e visualmente arrebatadora. A direção de arte é um espetáculo à parte: os cenários frios e luxuosos, banhados por luzes neon e sombras dramáticas, evocam tanto o lirismo quanto a brutalidade, um contraste que se reflete na própria protagonista. A trilha sonora — minimalista e atmosférica — acompanha cada respiração, cada disparo, cada passo de dança com uma precisão quase cirúrgica.

O grande diferencial de Bailarina está nas sequências de ação, verdadeiras coreografias cinematográficas que fundem técnicas marciais com movimentos do balé clássico. Longe de ser apenas um recurso estético, essa escolha dá ao filme um ritmo singular, onde violência e beleza caminham lado a lado. Cada embate é filmado com clareza e impacto, respeitando o espaço físico dos personagens e valorizando o desempenho dos atores.

Ana de Armas, por sua vez, entrega uma das performances mais cativantes de sua carreira. Sua Eve é silenciosa, letal, mas profundamente humana. A dor da perda e o desejo de justiça movem a personagem, que encontra no instinto assassino não apenas sobrevivência, mas expressão emocional. A atriz transita com naturalidade entre o lirismo de uma bailarina e a ferocidade de uma vingadora, imprimindo carisma e intensidade a cada cena.

Ainda assim, Bailarina não escapa de alguns tropeços. A narrativa, embora funcional, não traz grandes reviravoltas ou surpresas. Em comparação aos capítulos principais da franquia, falta à trama uma teia de subtramas e conexões mais intrincadas. O roteiro se mantém focado e direto — o que pode ser positivo em termos de ritmo, mas limita a ambição da história.

No entanto, como extensão do universo John Wick, o filme acerta em cheio. Introduz novos elementos mitológicos, expande personagens secundários com inteligência e prepara o terreno para futuras conexões — tudo isso sem perder sua identidade própria. Bailarina é um spin-off que respeita suas origens, mas ousa experimentar novas formas, tons e narrativas.

Crítica – Extermínio: A Evolução mantém viva a mitologia da saga e mostra que o apocalipse ainda tem fôlego

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Depois de quase duas décadas de espera, o universo pós apocalíptico criado por Danny Boyle e Alex Garland em Extermínio (2002) e expandido em Extermínio 2 (2007) ganha um novo e eletrizante capítulo: 28 Anos Depois. Sob nova direção, o terceiro filme da saga não apenas resgata os elementos clássicos que consagraram a franquia, como também injeta uma nova dose de humanidade, suspense e crítica social em meio a hordas de infectados.

Uma nova geração no centro do caos

A trama se inicia em uma ilha aparentemente protegida da praga viral que devastou o Reino Unido. Ali, uma pequena comunidade sobrevive de forma quase utópica: plantações, treinamentos rígidos e um ritual de passagem inquietante — adolescentes são enviados ao continente aos 15 ou 16 anos para provar sua habilidade em combater zumbis. É nesse cenário que conhecemos Spike e seu pai Jamie, protagonistas dessa nova fase.

O jovem Spike é mais do que um herói improvável. Ele é o espelho de uma geração nascida em ruínas, forjada na ausência de uma civilização tradicional e obrigada a carregar o legado de um apocalipse que nunca viveu, mas do qual precisa sobreviver. Jamie, por sua vez, representa os fantasmas do passado: um pai endurecido pela dor, tentando proteger o filho do mesmo mundo que já o destruiu.

Zumbis além do susto: um continente em decomposição

Ao chegarem ao continente, Spike e Jamie enfrentam um território quase fantasma — resquícios de uma Inglaterra abandonada, mas não esquecida. O filme acerta em cheio ao mostrar o contraste entre o que sobrou da sociedade e o que ela se tornou: ruínas, silêncio e o medo constante do desconhecido. O terror aqui não vem apenas da velocidade e ferocidade dos infectados, mas da sensação sufocante de solidão, abandono e desumanização.

E o longa ainda surpreende ao introduzir novas variantes dos infectados e personagens isolados que conseguiram sobreviver contra todas as probabilidades, revelando nuances emocionantes e inesperadas.

Direção visceral, ritmo afiado

A direção, ainda que diferente do estilo visual de Boyle, é competente e envolvente. Cada cena é carregada de tensão e energia. A trilha sonora cumpre bem o papel de amplificar a angústia, enquanto a fotografia — por vezes crua, por vezes poética — ressalta a beleza sombria de um mundo à beira da extinção.

Não faltam cenas de ação eletrizantes, perseguições de tirar o fôlego e momentos de pura emoção. Mas o ponto mais alto está mesmo na construção emocional dos personagens e no modo como o roteiro lida com a ideia de herança: o que deixamos para os nossos filhos em um mundo que já acabou?

Mais do que um filme de zumbis

28 Anos Depois não é apenas uma continuação ou um bom filme de zumbis — é uma obra sobre sobrevivência, amadurecimento e a busca por um novo sentido em meio ao caos. O longa consegue emocionar, provocar reflexões e, ao mesmo tempo, entregar uma experiência digna das melhores sessões de cinema: intensa, catártica e imprevisível.

Sem dar spoilers, fica a dica: vá preparado para mais do que sangue e sustos. Spike entrega não só coragem, mas também alma. E isso faz toda a diferença.

Crítica – Covil de Ladrões 2 entrega adrenalina pura e foco na tensão dramática

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A sequência de Covil de Ladrões abandona subtramas familiares já desgastadas para investir em uma narrativa mais objetiva, centrada na tensa relação entre Nick (Gerard Butler) e Donnie (O’Shea Jackson Jr.). A escolha confere dinamismo ao filme, resultando em uma experiência eletrizante que mantém o público atento do início ao fim.

As cenas de assalto continuam sendo o grande trunfo da franquia, com coreografias bem executadas que potencializam a tensão a cada instante. Destaque para uma perseguição de carro intensa e meticulosamente filmada, deixando o público na ponta da cadeira. A direção acerta ao equilibrar sequências frenéticas com momentos de planejamento estratégico, evitando excessos visuais que poderiam comprometer a imersão.

O roteiro, apesar de não reinventar o gênero, adota diálogos incisivos e reviravoltas pontuais, mantendo a narrativa enxuta e eficiente. Essa abordagem minimalista se revela um acerto, já que elimina distrações desnecessárias e intensifica o foco nos confrontos centrais.

O desfecho é outro ponto positivo, surpreendendo ao deixar uma porta aberta para futuras tramas, sugerindo novos conflitos e alianças inesperadas. Embora não alcance o refinamento visual dos grandes blockbusters do gênero, a produção se consolida como um thriller sólido e direto, ideal para os aficionados por ação intensa e tensão bem calibrada.

Covil de Ladrões 2 entrega o que promete: adrenalina pura e cenas memoráveis. Para aqueles que buscam entretenimento direto e envolvente, é uma escolha certeira.

Crítica – A Verdadeira Dor mostra um mergulho intenso nas contradições do amor e da humanidade

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A Verdadeira Dor mergulha na complexidade emocional de ser visto e amado por quem realmente somos, como o título já sugere. O filme aborda, de forma crua e desprovida de glamour, o desconforto – e, às vezes, o horror – de enfrentar partes de nós mesmos que preferiríamos esconder. Contudo, é exatamente nesse confronto que reside a essência do amor verdadeiro.

Jesse Eisenberg e Kieran Culkin entregam atuações excepcionais. Com uma seriedade comovente, ambos transformam uma história que poderia ser apenas estranha, embaraçosa e dolorosa em algo inesperadamente otimista e profundamente humano.

O maior fascínio deste estudo de personagens está na forma como a relação entre eles expõe suas vulnerabilidades, forçando-os a enfrentar as raízes de seus conflitos internos. David e Benji encontram um no outro o reflexo do que falta em si mesmos. Sem grandes reviravoltas ou arcos narrativos chamativos, o filme acompanha um processo íntimo: dois homens aprendendo a lidar com as emoções que provocam um no outro e, no meio disso, descobrindo um tipo de paz.

A narrativa conecta o público de forma natural aos dilemas apresentados. A dinâmica entre David e Benji – uma mistura de amor, ódio e inveja – é desconcertantemente familiar. Eles simbolizam lados opostos de todos nós: o leão ativo e o leão adormecido, em uma batalha interna constante.

O filme também explora temas universais como trauma, luto, dinâmicas emocionais e sociais, além de questões como classe e privilégio, com uma profundidade que toca o espectador. É difícil não se reconhecer nas nuances dos personagens.

Com um roteiro brilhante e atuações impactantes, A Verdadeira Dor não apenas emociona, mas também desafia o público a refletir sobre quem somos e como nos conectamos uns com os outros. É um convite à introspecção que permanece com você muito depois do final.

Crítica – A Profissional é um thriller que combina vingança e emoção

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A Profissional (2021), dirigido por Martin Campbell, é um thriller de ação que consegue ir além da violência e do suspense, entregando uma experiência envolvente com uma trama sólida e personagens bem desenvolvidos. A história acompanha Anna (Maggie Q), uma assassina de aluguel habilidosa que, após a morte brutal de seu mentor e figura paterna, Moody (Samuel L. Jackson), embarca em uma jornada de vingança. Ao longo do caminho, ela é forçada a confrontar não apenas seus inimigos, mas também seus próprios dilemas internos e crenças. Maggie Q entrega uma performance marcante, equilibrando a vulnerabilidade emocional de Anna com a frieza e precisão de uma assassina profissional. A relação entre Anna e Moody é o coração do filme, com o roteiro dedicando tempo para explorar o profundo vínculo entre mentor e aprendiz, adicionando uma camada de emoção à narrativa.

Michael Keaton também brilha como o vilão enigmático, trazendo um antagonista com motivações complexas e uma conexão com o passado de Anna. A dinâmica entre os dois, marcada por uma mistura de atração e antagonismo, cria um jogo psicológico tenso que mantém o espectador intrigado. Embora o enredo ocasionalmente siga caminhos previsíveis, com alguns clichês típicos do gênero, a química entre os personagens principais e o equilíbrio entre cenas de ação intensas e momentos introspectivos tornam o filme mais profundo e cativante. As sequências de luta, coreografadas com precisão e intensidade, servem não apenas como espetáculo visual, mas também para refletir os conflitos internos de Anna.

O grande diferencial de A Profissional está no seu equilíbrio entre ação e desenvolvimento de personagem. Em vez de se limitar a uma narrativa convencional de vingança, o filme aborda questões morais e o peso das escolhas de Anna, explorando o que realmente significa ser uma “profissional”. A direção de Martin Campbell mantém a tensão elevada sem recorrer a exageros, entregando um filme que, embora não apresente grandes inovações no gênero, se destaca pela autenticidade emocional e pela profundidade de sua protagonista.

No geral, A Profissional é uma excelente escolha para os fãs de thrillers de ação que buscam mais do que explosões e tiroteios. Com atuações fortes, uma narrativa envolvente e um equilíbrio cuidadoso entre emoção e adrenalina, o filme oferece uma experiência marcante e satisfatória.

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